Das nossas Histórias

Eu sou de humanas desde muito nova. Minhas aulas favoritas sempre foram as de Português, História, Literatura e Filosofia, mas dentre todas essas, a única que eu tinha gosto mesmo por estudar era História. Ela era meu xodó.

História nos explica porque a gente vive como vive. Ela conta tudo, em detalhes, de como nós nos tornamos, bem, nós. Isso sempre me fascinou, porque eu gosto de saber do porquê das coisas. Eu bem sei que o que a gente aprende na escola não é metade do que de fato aconteceu. Sei também que existem manipulações (não necessariamente ruins, às vezes é pra tornar o entendimento mais fácil) nas informações que nos são dadas, então eu sempre recorri a outras fontes, porque queria saber o que tinha realmente acontecido.

Tive professores maravilhosos no colégio. Pessoas que, na minha opinião, são o que professores devem ser para seus alunos: instigadores. Eles me contavam histórias, ou Histórias, e eu tinha (tenho até hoje, de vez em quando) uma vontade sobre-humana de viver aquilo e saber mais e mais… foram eles que me apresentaram os caminhos para que eu chegasse onde estou hoje, moral, social e politicamente falando.

Falando em política, vamos lá.

A partir, mais ou menos, do segundo ano do ensino médio, eu aprendi de fato o que significava ser de direita ou de esquerda – mesmo que, ainda hoje, eu não tenha aprendido tudo. Vou explicar rapidinho pra vocês que não sabem, e também pra situar todo mundo:

Os termos “direita” e “esquerda” ganharam uma ideologia política na primeira fase da Revolução Francesa, entre 1789 e 1799. Durante as assembleias, a burguesia queria diminuir os poderes da nobreza e do clero; para tanto, contava com o apoio da população mais pobre. Na assembleia em que seria criada a nova Constituição da França, a nobreza (ou elite) não quis se misturar com os pobres, então houve uma divisão na disposição dos lugares: a nobreza sentou-se à direita da sala e a burguesia, acompanhada das classes mais pobres, sentou-se à esquerda.

Algo mais ou menos assim

Algo mais ou menos assim

Sim. É simples, talvez até simplório, mas é isso. A partir dessa visão, ser “de esquerda” implica em lutas por direitos trabalhistas, a promoção do bem-estar coletivo e a presença de movimentos sociais; enquanto ser “de direita” implica em um comportamento mais conservador e tradicional que visa a promoção do bem-estar individual.

Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, e o fim da polarização EUAxURSS, essas expressões se ampliaram. Não mais definições de conceitos fixos, elas designam diversos conteúdos conforme os tempos e as situações.

O filósofo político Norberto Bobbio escreveu em seu livro “Direita e Esquerda – Razões e Significados de uma Distinção Política”:

“Esquerda e direita indicam programas contrapostos com relação a diversos problemas cuja solução pertence habitualmente à ação política, contrastes não só de ideias, mas também de interesses e de valorações a respeito da direção a ser seguida pela sociedade, contrastes que existem em toda a sociedade e que não vejo como possam simplesmente desaparecer. Pode-se naturalmente replicar que os contrastes existem, mas não são mais do tempo em que nasceu a distinção”

O que isso significa? Que o cenário político contemporâneo não comporta mais uma definição tão simplista dessas ideologias, apesar de elas ainda serem tratadas como coisas simples.

Aqui no Brasil, cresceu-se o debate sobre a esquerda e a direita durante a ditadura militar, pois a oposição ao regime militar vigente pregava o socialismo. Basicamente, as ideologias de direita estavam englobadas nos militares, enquanto os combatentes englobavam ideologias de esquerda.

Conforme o tempo passou, esquerda e direita se tornaram o que chamamos “termos guarda-chuva”, termos genéricos que englobam outras definições mais específicas. Para a direita, desenvolveram-se os conservadores, democratas-cristãos, liberais e, para pensamentos mais extremos, nazistas e fascistas. Para a esquerda, temos socialdemocratas, progressistas, ambientalistas e, também do lado mais extremo, o totalitarismo.

“E onde você está nessa confusão toda, Letícia?”, vocês me perguntam. Eu faço parte do lado esquerdo da força. Com tudo o que pesquisei, não consegui encontrar um termo que definisse exatamente o que eu quero, mas as ideias propagadas por ideologias de direita com certeza não me contemplam.

Agora, o que eu quero realmente dizer com todo esse blábláblá.

Todo mundo tem acompanhado o pandemônio que virou a política brasileira. Ou você vive debaixo de uma pedra, ou você tá sentindo que as coisas estão por um fio. E é sobre isso que eu quero, de fato, falar.

Hoje voltamos com a separação simplista e rasa de “esquerda” e “direita”, só que o nome que damos a isso é “petralha” e “coxinha”. E isso está ficando perigoso. Eu, obviamente, fui taxada de petralha.

Quem não conversa comigo sobre essas coisas, entra no meu perfil do Facebook, por exemplo, e afirma com todas as letras que eu apoio o governo. Os mais radicais dizem que eu defendo bandido. Curiosamente, é parecido com o tratamento disposto a quem não concordava com o governo na época da ditadura.

A questão é: eu não concordo com o governo. Mas estudei o suficiente pra saber que a solução apresentada, não é solução. Não existe motivo o suficiente que justifique um processo de impeachment para a nossa presidenta. Eu ser contra esse processo não significa que eu apoie as decisões do governo Dilma.

Estamos em um momento da história em que sentimos os resultados de todos os anos de educação negligenciada. Sentimos os efeitos de sermos uma nação que não lê, só vê TV e só assiste à Globo.

As pessoas estão tão cegas em sua sede por justiça, que elas não se importam de marchar ao lado de corruptos, de fascistas e propagadores de ódio. Foram tão bem manipuladas por quem está no poder e quer permanecer assim, que aceitam passar por cima da lei para verem seu objeto de ódio atrás das grades.

Não foram poucas as vezes em que eu participei de uma conversa onde a pessoa A falava “Não, mas isso foi ilegal, ele não podia ter feito isso”, e a pessoa B responde “Mas tem que prender esses caras, de um jeito ou de outro”. Quando se trata da piñata, não importa se está dentro da lei ou não, o importante é vê-la quebrar. Isso não pode continuar assim.

Não é sobre defender um lado ou o outro, é sobre ser, de fato, justo. É sobre saber que a situação não pode continuar da forma em que está, mas que existem coisas preciosas demais para serem sacrificadas só para que você esteja certo.

Nossa democracia é uma menina ainda, mal chegou aos seus 40 anos. Estamos nos recuperando de uma longa e perigosa doença que nos deixou à beira da morte. Não podemos ser egocêntricos a ponto de realmente acharmos que, só porque a ditadura acabou, nós sabemos fazer democracia. Estamos nos construindo como país nessa parte e isso não vai ser fácil por um bom tempo ainda.

Então meu intuito aqui não é só dar vazão a pensamentos que venho juntando há semanas. Quero deixar um apelo a todos vocês. Para que não sejam contaminados por esse ódio sem sentido. Olhem além, estudem sobre o que está acontecendo e para onde nossas ações estão nos levando. Entendam o momento pelo qual estamos passando e não deixem que oportunistas nos distraiam de percorrer o caminho certo. Não sejam seletivos e exijam justiça de todos os lados.

A hora é agora de realmente definirmos nosso futuro, não deixem que façam isso por nós. É nosso dever assumirmos controle da situação.

Afinal, estamos ou não em uma democracia?

Pensamentos de fora